quinta-feira, 21 de agosto de 2014

A SINA DOS "INHOS"


Quando somos bebes, é costume falarem-nos de forma estereotipada: “abébezada” - algo que olhando para a beleza, fragilidade e indefesa de seres tão pequenos, nos impele inexplicavelmente a trata-los diferenciadamente. Dizem os especialistas, que não o devemos fazer… que não é positivo para o seu desenvolvimento e atualmente, embora persistam esses comportamentos, já é algo que se faz com menos regularidade. Entretanto com o crescimento das crianças, a demonstração das suas capacidades e a forma como se vão mostrando tão incrivelmente astutos nas mais diversas situações, vai-se perdendo cada vez mais a tal forma errada de tratar as crianças como bebés, até que por volta dos 9-10 anos (creio), já poucos ou nenhuns o fazem e essa normalização da relação ocorre naturalmente. Quando uma criança apresenta uma alteração ao seu padrão normal de desenvolvimento, o estereótipo deste tipo de tratamento por parte dos outros, não normaliza e sucede termos casos de adolescentes, jovens e até homens a serem continuada e eternamente tratados por “inhos” – (Paulinho, Pedrinho, Joãozinho, Martinha, Ritinha… Vasquinho). Não é por mal – dizem a maioria das pessoas – e obviamente que não é! Mas eu também não vejo em que é que possa vir a ser-lhes benéfica a distinção (tal como não o é para nenhuma outra criança). Acresce que do ponto de vista da sensibilização para estas questões, ainda nos encontramos a anos luz do desejável e esta atuação definitivamente não ajuda. Podia falar de vários aspetos onde a utilização destes diminutivos é prejudicial ao desenvolvimento de vida destas pessoas, mas vou-me escusar, até porque é basicamente igual ao da generalidade das pessoas, pelo que vou focar-me  apenas num aspeto – neles próprios e no seu sentir! Coloquemo-nos no lugar da pessoa que apesar da sua condição diferente, pensa, sente e percebe que é tratada por e como um “inho” apesar da sua idade. Percebe aliás que é porventura o único “inho” da sua zona, o único “inho da sua família, da sua escola, do grupo… Percebe que o fazem, mesmo contra seu gosto, percebe que continuam, mesmo contradizendo os seus pedidos e só não percebe é porque é que raio o fazem! Não percebe a pessoa visada, nem percebem muitas vezes as pessoas que o fazem... E eu, que normalmente até as compreendo, tenho uma tese que vou aqui atrever-me a partilhar:

As pessoas com deficiência são, aos olhos da sociedade em geral vistas como incapazes, ou mais incapazes, ou pouco capazes… São pessoas com muitas ou todas as portas fechadas, a quem o destino, por ”pouca sorte”, traça um caminho único. As pessoas com deficiência, são vistas como todas iguais e são coitadinhos, são “inhos” a quem devemos dar beijinhos e abracinhos (isto num panorama da melhor das hipóteses)… É algo como isto que está no subconsciente de quase toda a gente, pelo que só talvez daqui a séculos - (contando com o desenvolvimento de uma educação baseada no respeito pelo outro e nos desígnios de uma sociedade inclusiva) – possamos vir a sonhar com uma visão e perspetiva diferente acerca das pessoas com deficiência, ou diferentes ou com especiais necessidades ou como lhe queiram chamar!

É como mãe de uma dessas pessoas, que entretanto cresceu e me começou a questionar porque é que lhe chamam Vasquinho, que deixo esta reflexão. Mãe de um adolescente que pede sempre que não lhe chamem Vasquinho, quando por carinho o fazem constantemente;  É é também como mãe, que valoriza todas e cada uma das pessoas, que sem querer às vezes ainda lhe chamam Vasquinho por gostarem tanto dele;  que eu digo:

Ninguém gosta mais dele do que eu ou o pai e nós conseguimos ultrapassar essa “deficiência” que tínhamos na forma de o tratar e de nos relacionarmos com ele.

Ele tem esse direito – o direito a ser tratado por VASCO, como natural e usualmente tratam todos os seus amigos, primos ou colegas da sua idade…   João, Pedro, Luis, Nuno ou Manuel.

“Sou VASCO! O meu nome é VASCO” – Diz ele tantas vezes (só espero que nunca se canse)!

Nós por cá continuaremos, calma e pacificamente a compreender todos os nossos amigos e sempre na disposição de juntos aprendermos mais sobre a diferença. Nós por cá continuaremos na luta por direitos, no respeito por deveres e em força para sensibilizar todos quantos para nós estiverem voltados! Fico tranquila por saber que posso escrever aqui o que escrevi hoje, sem melindres, porque são os nossos AMIGOS que mais usam os “inhos” (os outros nem nos chamam) e claro que não é por mal, sendo que também é por bem que me sinto no dever de deixar-vos aqui estas palavras de sinceridade.
 
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