sexta-feira, 23 de julho de 2010

PERGUINTAS DIFÌCEIS



"... Como chama o teu médico?"
"... Como chama o médico da Avó?"
"... Como chama o médico do Gabriel?"
Ultimamente, pergunta-me o Vasco o nome dos médicos de várias pessoas que conhece. Costumo préviamente prepara-lo, quando temos uma consulta, para que ele aceite melhor os momentos de consultório, que nunca gostou particularmente.
Começou depois a perguntar-me expontaneamente os nomes dos médicos de outras pessoas, como quem quer saber se os outros também vão ao médico. Decidi dizer-lhe (e creio que não menti, que toda a gente tem um médico, para ver se estamos bem. Pareceu-me que gostou da ideia de não ser apenas ele a ter médicos e a coisa ficou esclarecida.
Hoje, quando o chameí para lhe dar o remédio (risperdal), ele tomou-o - como sempre - mas como nunca o tinha feito antes, perguntou-me em jeito de afirmação: "O Vasco está doente". Esta frase, engasgou-me a alma e não consegui de imediato responder... Preciseí assimilar o que ia no pensamento do meu Vasco. Não fiqueí com a certeza absoluta, mas suspeito que ele começa a entender a sua "diferença"... As pistas começam a denunciar uma certa evidencia desse seu entendimento. (Será?)
Estupidamente, disse-lhe que são vitaminas para ele crescer e ficar forte - não soube o que lhe responder. (Nítidamente chumbeí neste teste, e senti-me pequena ao pé dele).
Por agora creio que, ainda que mal porque menti, resolvi a questão, mas já se me afiguram no pensamento outras perguntas dificeis, para as quais, talvez deva preparar-me melhor!

segunda-feira, 19 de julho de 2010

UMA MENSAGEM EM 4 IMAGENS

Neste blog, procuro dar a conhecer, as Perturbações do Espectro do Autismo.(Espectro quer dizer que a perturbação se apresenta numa espécie de escala de sintomatologias, variaveis desde um grau mais severo até ao mais leve).
Relato sobretudo, as minhas experiencias particulares - e assim o continuareí a fazer - no entanto, e como cada caso é efectivamente um caso, fiz algumas buscas de videos no sentido de clarificar o melhor possivel esta condição, para que compreendam a sua imensa diversidade... (Que nenhuma mãe ou pai sinta que fica de fora, porque apenas é abordado um determinado tipo de Autismo). Desde de que convivo com "ele", sinto-o como uma causa única, onde desejo para TODOS - independentemente do tipo de gravidade - as melhores condições, um maior conhecimento, e a melhor aceitação social. (PARA TODOS)!

Acredito que por mais força que tenham as palavras, o peso de uma imagem, consegue ser muitas vezes bastante mais esclarecedor. Nesta perspectiva, elegi as minhas quatro ultimas postagens como "agente divulgador" da mensagem.
As duas ultimas relatam os dois extremos do Quadro Autístico: Severo a Savant. (Pelo que leio - são em numero, os que representam uma menor percentagem de ocorrências).
Nas anteriores, revejo-me um pouco, e por isso mesmo as escolhi para iniciar este ciclo, que aqui termina, com a seguinte frase:

Ser Mãe é assumir de Deus o dom da criação, da doação e do amor incondicional. Ser mãe é encarnar a divindade na Terra.
Barbosa Filho

ROSTOS DO AUTISMO (Autismo Savant)

ROSTOS DO AUTISMO (Autismo Severo)

segunda-feira, 12 de julho de 2010

DE FÉRIAS DA ESCOLA


As férias do Vasco prosseguem. Ele, claro, está radiante da vida. Ainda que eu perceba que tem saudades da escola e dos colegas, professores e auxiliares. Fala imenso neles, pede-me para escrever coisas sobre a escola, fazer desenhos da sala de aula e faz comentários que entendo como perguntas. Por casa a vida decorre sem regras muito rígidas, ele é o rei, e essa personagem encaixa-lhe bem, como a todas as crianças, (penso). Eu bem tento impôr-lhe regras, mas parece que ele intuí a minha "fraqueza" e muitas vezes não faz grande caso do que lhe tento impôr. Preciso mostrar-me de facto muito zangada, para ele acatar todas as regras. Tenho que admitir que não consigo fazer melhor... Não consigo ser tão disciplinadora quanto talvez tivesse que ser! Tenho a plena noção que não é boa alternativa as crianças ficarem apenas por casa com as mães, especialmente se forem "fracas" como eu. O Vasco é de facto o meu "Calcanhar de Aquiles"... Nunca lho disse e mostro-me séria quando tem de ser, mas vejo que não lhe provoca grande receio, por assim dizer.
Tenho criado rotinas, uma vez que sei a sua importancia no seu dia a dia. Levantamos e tomamos o pequeno almoço juntos. Arrumamos um pouco as coisas e normalmente vamos os dois às compras, depois brincamos um bocado e ele próprio avisa-me que se aproxima a hora do almoço. Fazemos o almoço - ele sempre "pendurado" (literalmente) em mim, vai-me dando beijinhos, abraços e apertões, como quem me diz que está feliz por estar comigo. Eu também me sinto feliz ao pé do meu menino, mas confesso que sinto que não sou uma "boa companhia" para todas as horas. Por vezes preciso de uns minutos para respirar...
A escola e demais actividades adequadas para eles, são absolutamente fundamentais. Tanto do ponto de vista social, como das aprendizagens. Todos os dias, treinamos algumas das aprendizagens ao de leve - (inclusivé ele pede-me porque assim está habituado), mas não é a mesma coisa. Os contextos são diferentes.
As férias são evidentemente necessárias, mas demasiado grandes para nós - práticamente 3 meses não são compatíveis nem com as vidas profissionais normais, nem com o mais adequado para eles.
As actividades que existem a nivel privado pensadas para estes periodos, são pagas - na maior parte das vezes - a "peso de ouro" e diga-se de passagem, que são poucas para a quantidade de quem as quer e podería pagar. Por outro lado, os ATL's escolares, organizados pelas Associações de pais, nem sempre estão disponíveis para situações de crianças com necessidades especiais... (Na maior parte das vezes, as crianças diferentes não têm lugar nestes espaços). Esta lacuna é um facto e tem de admitir-se sem subterfugios a existencia de uma total despreocupação das Entidades competentes, e até da sociedade civil, quanto a estes casos. Efectivamente, apenas quem sente estas questões mais directamente, sabe avaliar com exactidão aquilo que estou a dizer.
Falo por mim, mas também pelos inumeros casos que sei existirem por este nosso pais, de norte a sul - muitos deles aliás noticiados como situações inaceitáveis, mas que persistem sem grande alteração - apesar da aparente indignação que provocam. Muitas vezes age-se como se não existíssemos, como se não tivessemos as comuns necessidades de todos os pais... pensarão talvez que somos tão diferentes que não temos os mesmos problemas? Temos os mesmos - os de toda a gente - acrescidos de outros, (creio que não é dificil imaginar). A realidade é pois inversa - as nossas necessidades de apoio são por certo maiores, mas poucos parecem querer olhar para isso. Os que olham com mais atenção - (e para eles a minha mais sincera gratidão) - não conseguem contudo ultrapassar com a rapidez necessária, todas as barreiras que também se lhes levantam... mas com calma vamos conseguir - assim o espero.


Por enquanto, e ainda que com algum cansaço, (porque as exigências não são poucas), os dias vão passando e eu vou conseguindo inventar formas de ocupar cada dia de forma positiva... Por enquanto ainda não trabalho, e por incrível que pareça quase rezo para que ele não surja neste momento, porque a verdade é que não sabería que resposta agradável tinha para dar ao meu filho, na minha ausência para ganhar a vida, como toda a gente!

terça-feira, 6 de julho de 2010

OUTRAS VIDAS IV (TRANSCRIÇÂO)

A saúde mental dos portugueses

Transcrição do artigo do médico psiquiatra Pedro Afonso, publicado no Público, 2010-06-21

Alguns dedicam-se obsessivamente aos números e às estatísticas esquecendo que a sociedade é feita de pessoas.

Recentemente, ficámos a saber, através do primeiro estudo epidemiológico nacional de Saúde Mental, que Portugal é o país da Europa com a maior prevalência de doenças mentais na população. No último ano, um em cada cinco portugueses sofreu de uma doença psiquiátrica (23%) e quase metade (43%) já teve uma destas perturbações durante a vida.

Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque assisto com impotência a uma sociedade perturbada e doente em que violência, urdida nos jogos e na televisão, faz parte da ração diária das crianças e adolescentes. Neste redil de insanidade, vejo jovens infantilizados incapazes de construírem um projecto de vida, escravos dos seus insaciáveis desejos e adulados por pais que satisfazem todos os seus caprichos, expiando uma culpa muitas vezes imaginária. Na escola, estes jovens adquiriram um estatuto de semideus, pois todos terão de fazer um esforço sobrenatural para lhes imprimirem a vontade de adquirir conhecimentos, ainda que estes não o desejem. É natural que assim seja, dado que a actual sociedade os inebria de direitos, criando-lhes a ilusão absurda de que podem ser mestres de si próprios.

Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque, nos últimos quinze anos, o divórcio quintuplicou, alcançando 60 divórcios por cada 100 casamentos (dados de 2008). As crises conjugais são também um reflexo das crises sociais. Se não houver vínculos estáveis entre seres humanos não existe uma sociedade forte, capaz de criar empresas sólidas e fomentar a prosperidade. Enquanto o legislador se entretém maquinalmente a produzir leis que entronizam o divórcio sem culpa, deparo-me com mulheres compungidas, reféns do estado de alma dos ex-cônjuges para lhes garantirem o pagamento da miserável pensão de alimentos.

Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque se torna cada vez mais difícil, para quem tem filhos, conciliar o trabalho e a família. Nas empresas, os directores insanos consideram que a presença prolongada no trabalho é sinónimo de maior compromisso e produtividade. Portanto é fácil perceber que, para quem perde cerca de três horas nas deslocações diárias entre o trabalho, a escola e a casa, seja difícil ter tempo para os filhos. Recordo o rosto de uma mãe marejado de lágrimas e com o coração dilacerado por andar tão cansada que quase se tornou impossível brincar com o seu filho de três anos.

Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque a taxa de desemprego em Portugal afecta mais de meio milhão de cidadãos. Tenho presenciado muitos casos de homens e mulheres que, humilhados pela falta de trabalho, se sentem rendidos e impotentes perante a maldição da pobreza. Observo as suas mãos, calejadas pelo trabalho manual, tornadas inúteis, segurando um papel encardido da Segurança Social.

Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque é difícil aceitar que alguém sobreviva dignamente com pouco mais de 600 euros por mês, enquanto outros, sem mérito e trabalho, se dedicam impunemente à actividade da pilhagem do erário público. Fito com assombro e complacência os olhos de revolta daqueles que estão cansados de escutar repetidamente que é necessário fazer mais sacrifícios quando já há muito foram dizimados pela praga da miséria.

Finalmente, interessa-me a saúde mental de alguns portugueses com responsabilidades governativas porque se dedicam obsessivamente aos números e às estatísticas esquecendo que a sociedade é feita de pessoas. Entretanto, com a sua displicência e inépcia, construíram um mecanismo oleado que vai inexoravelmente triturando as mentes sãs de um povo, criando condições sociais que favorecem uma decadência neuronal colectiva, multiplicando, deste modo, as doenças mentais.

E hesito em prescrever antidepressivos e ansiolíticos a quem tem o estômago vazio e a cabeça cheia de promessas de uma justiça que se há-de concretizar; e luto contra o demónio do desespero, mas sinto uma inquietação culposa diante destes rostos que me visitam diariamente.

Pedro Afonso
Médico psiquiatra

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Sensibilização - Autismo

Uma das mais básicas entraves a uma boa inclusão de crianças com perturbações do espectro do Autismo na nossa sociedade, parece-me ser o desconhecimento. Receia-se o que se desconhece...
Opina-se erradamente sobre o que não se conhece e por norma, o desconhecido é evitado.
Precisamos aparecer, mostrar, divulgar, SENSIBILIZAR, para abrir caminhos.
Muitos, caminharão naturalmente connosco, outros virar-nos-ão a cara mesmo conhecendo - mas é nossa obrigação como pais, ir alargando horizontes, para criar oportunidades de escolha àqueles que andam ao nosso lado, mas não nos vêm.
Esta realidade existe e crescem o numero de crianças diagnosticadas como portadoras desta perturbação. Os Autistas não vivem noutro mundo - vivem no nosso - e têm realmente especiais necessidades, que urge colmatar. Para começar, bastaria talvez, que elas fossem mais amplamente conhecidas, compreendidas e seriamente consideradas.
Nesta perspectiva e na de ir adquirindo sempre o máximo de conhecimentos, assisto sempre que posso, a palestras, debates, workshops, onde este seja o tema, e divulgo.
No passado dia 01 de Julho, estivemos (eu e o pai), presentes numa palestra muito especial...
Um auditório cheio, uma organização exemplar e pessoas excepcionais.
Na tela, imagens de 6 crianças e suas actividades diárias... Uma delas era o meu menino - O Vasco.
Não consigo descrever o orgulho que senti e a alegria imensa pelo meu filho fazer parte daquele "filme" feliz - uma Unidade de Ensino Estruturado, provavelmente de excepção. Um recurso estatal, fruto do empenho e dedicação de quem todos os dias dá muito de si, num "trabalho" que sem duvida, AMAM! Não podereí agradecer-lhes nunca, a forma como tratam cada um destes meninos, não se escudando nas falhas do sistema. O sistema tem obviamente falhas, mas as coisas, muitas vezes resultam, quando a vontade é maior! O sistema são as pessoas... onde ele falha devemos melhora-lo!
Vários factores, tiveram e têm que se conjugar sempre, para que o caminho se vá fazendo - As crianças especiais "obrigam" à união de entendimentos conjuntos, entre várias entidades de uma comunidade para que seja possivel o sucesso da sua integração - Câmaras Municipais, Agrupamentos de escolas, Associações de Pais, técnicos externos, professores de ensino especial, professores de ensino regular, auxiliares de educação e pais - todos têm que convergir no mesmo sentido. Disso depende o bem estar presente e o futuro de tantas crianças e suas familias. Quando alguma destas "engrenagens" não funciona, tudo se complica e o final do "filme" não é certamente o mais feliz.
Por conseguinte, o caminho tem sido lento e longo... mas vai-se fazendo.
Desejo e espero cada vez mais ouvir e conhecer, histórias felizes. Desejo e espero cada vez menos ouvir de tantas mães, que o meu Vasco tem sorte... (o que subentendo como uma queixa da falta dela, para os seus filhos). Não é fácil ter a sorte nas mãos da vontade dos outros, quando os outros não tem grande vontade.
 
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